sábado, março 28, 2009

 

Contaminação do Leite Materno


Antes de ler o longo artigo abaixo, convém lembrar que o leite materno, contaminado ou não, é o melhor alimento para o recém-nascido, durante seus primeiros meses de vida. Eis o artigo, que saiu em [1].

Nem o leite materno escapa de contaminação
Pesquisadora coletou 200 amostras em nove estados brasileiros; acúmulo de PCB é maior em São Paulo

Se já não bastassem a poluição do ar, dos solos, dos alimentos e da água, o leite materno revela-se também passível de contaminação pelas bifenilas policloradas (PCB), que são compostos organoclorados sintéticos. O leite materno é considerado o alimento mais completo do ponto de vista nutricional, já que sua composição é tida como essencial para o bom desenvolvimento físico e mental dos recém-nascidos. A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que todas as crianças sejam alimentadas exclusivamente com o leite materno até os quatro ou seis meses de idade.

Essa alimentação exclusiva em uma fase em que alguns órgãos ainda estão em desenvolvimento, torna os recém-nascidos o segmento da população mais vulnerável aos PCB, explica a pesquisadora Cláudia Hoffmann Kowalski, que acaba de apresentar sua tese ao Departamento de Ciência de Alimentos da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp. Na sua pesquisa, Cláudia avalia a contaminação do leite materno brasileiro por PCB e propõe uma metodologia analítica para sua determinação.

O estudo objetivou um conhecimento mais amplo dessa problemática no Brasil. Para tanto, 200 amostras de leite materno foram coletadas em Bancos de Leite Humano (BLH) de nove estados brasileiros e questionários contendo 35 perguntas sobre hábitos alimentares, condições socioeconômicas, locais de habitação, entre outras, foram aplicados às mães que concordaram em participar da pesquisa. Os resultados obtidos na análise das amostras e os dados extraídos dos questionários, devidamente correlacionados através de técnicas adequadas, levaram à constatação de que em cidades metropolitanas o acúmulo de PCB no leite materno é mais expressivo que em outras regiões, a exemplo de São Paulo, onde 58% das amostras se revelaram contaminadas. Outra conclusão é a de que o leite maduro, aquele que passa a ser liberado pela mãe entre a segunda e a terceira semanas de amamentação, e possui maior porcentagem de gordura, é o mais contaminado.

O estudo mostrou ainda que o primeiro filho normalmente recebe dose maior de PCB dos que o sucedem, o que sugere um efeito cumulativo dessas substâncias no organismo ao longo dos anos. Os resultados mostram também que os maiores índices de contaminações verificaram-se no leite de mães que moram nas proximidades de indústrias ou rios poluídos, comprovando que esses compostos químicos chegam facilmente ao meio ambiente e, em seguida, aos seres humanos.

Características

Os PCB têm uma estrutura básica constituída por dois anéis benzênicos interligados, em que átomos de cloro podem substituir átomos de hidrogênio em dez posições possíveis. Teoricamente, dependendo do número de átomos de cloro que substituem os átomos de hidrogênio e de suas posições relativas, 209 congêneres são possíveis, mas somente 130 deles foram sintetizados para uso comercial.

O sucesso tecnológico desses produtos deve-se à diversidade de usos conferidos pelas suas notáveis propriedades químicas e físicas: são não-inflamáveis, pouco reativos, termicamente estáveis e alta resistência elétrica, características que os fizeram amplamente empregados como fluidos dielétricos em transformadores de potência e capacitores, fluidos hidráulicos, retardadores de fogo e isolantes térmicos. Foram também usados na composição de graxas e óleos lubrificantes, tintas, papeis copiativos sem carbono, tintas de impressão e pesticidas.

Sua produção em escala comercial teve início em 1930 em empresas como a Monsanto, Bayer entre outras. Em 1966 esses compostos foram detectados pela primeira vez no meio ambiente e, já na década de 1970, sua produção e uso foram restringidos ou banidos na Europa e Estados Unidos. Até 1993, ano em que sua produção mundial foi interrompida, mais de 1,3 milhão de toneladas de PCB foram produzidas.

A comercialização do PCB no Brasil foi proibida pela Portaria 19 de 29 de janeiro de 1981, mas seu uso é tolerado em equipamentos em funcionamento, até que eles sejam desativados ou substituídos. No Estado de São Paulo, a lei No. 12.288, de 22 de fevereiro de 2006, determina a eliminação de todos os equipamentos com PCB até o ano de 2020 (!).

Os PCB chegaram ao meio ambiente pela deposição intencional ou acidental em solos, rios, lagos e aterros sanitários de óleos, detritos contaminados ou artefatos como antigos transformadores e capacitores de potência (usados na transmissão de energia elétrica da usina geradora para o nosso lar ou local de trabalho). Ocorre também sua volatilização a partir dos locais de produção, uso e armazenamento e, ainda, durante o processo de incineração do lixo urbano que contenha artefatos ou detritos contaminados por PCB. Nos seres humanos, a contaminação pode ocorrer por inalação, contato com a pele e, principalmente, por ingestão de alimentos contaminados.

Os PCB foram incluídos entre os dez poluentes com maior potencial de biotoxicidade e compõem a lista dos doze poluentes prioritários do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, que tem como escopo a redução e a eliminação de poluentes orgânicos persistentes de elevada toxicidade.Eles encontram-se disseminados como poluentes do ar, da água, do solo e dos alimentos. São hidrofóbicos - e por isso não se unem às moléculas da água; lipofílicos - o que os levam a se unirem a partículas de gorduras; semivoláteis - o que facilita a sua disseminação pelo ar; e quimicamente inertes e altamente persistentes - o que lhes garante extenso poder de contaminação face ao grande tempo em que permanecem na natureza. Além disso, são bioacumulados ao longo da cadeia alimentar, sendo o homem e os animais superiores os seres vivos mais contaminados.

Devido à sua natureza lipofílica, no caso das mulheres, ocorre um maior acúmulo desses compostos nas glândulas mamárias e, consequentemente, nos recém-nascidos por elas amamentados. A concentração encontrada no leite materno é, em média, de quatro a dez vezes maior do que aquelas detectadas no sangue. Assim sendo, afirma Cláudia, "vale lembrar que mesmo antes do nascimento, o recém-nascido já é contaminado pela transferência dos PCB através da placenta".

Em vista disso, as crianças estão expostas a esses contaminantes antes do nascimento e à contaminação contínua através do leite das mães. Como consequência, podem apresentar calcificação anormal do crânio, pigmentação escura da pele e das membranas mucosas, hiperplasia gengival, baixo peso, anemia, crescimento reduzido e baixo QI. Além disso, as crianças com maiores níveis de PCB no organismo estarão mais propensas a problemas hepáticos, à imonossupressão, a neuropatias e ao aumento do risco de melanoma maligno, distúrbios respiratórios e do sistema nervoso central, alterações imunológicas e endócrinas. Muitos desses efeitos puderam ser constatados nas vítimas de dois acidentes ocorridos no Japão e em Taiwan, onde cerca de 3.900 pessoas foram contaminadas após consumirem óleo de arroz contendo concentrações altíssimas de PCB.

Importância da pesquisa

Cláudia lembra que a partir de 1970 surgiram as primeiras legislações restringindo o uso desses produtos, mas até hoje muitos países não estabeleceram restrições. Atualmente, nos países que realizam rigoroso controle, os limites máximos (LMR) permitidos para a soma dos PCB no leite materno variam de 20 a 60 microgramas/kg. No Brasil, não há legislação específica para os níveis desses compostos no leite materno. Estudos feitos com outros alimentos levaram a maioria dos países a estabelecer como LMR para a soma de PCB a concentração de 200 a 300 microgramas/kg, a exemplo de carnes e pescados. O Brasil também está se adequando a essas normas internacionais, já que a exportação desses produtos pode ficar comprometida caso sejam detectados valores acima desses limites.

A pesquisadora justifica sua motivação para a pesquisa: "Os estudos que existiam no Brasil sobre esse tema eram localizados e pontuais. Além disso, devido às características dos PCB, imaginávamos que mães que habitassem em regiões altamente industrializadas ou próximas à costa* brasileira poderiam apresentar maiores contaminações por PCB. Por isso decidimos trabalhar com amostras de várias regiões do Brasil, para poder compará-las, como São Paulo - bairros de Belemzinho e Santo Amaro -, Vitória (ES), Florianópolis (SC), Rio Branco (AC), Curitiba (PR), Natal (RN), Araxá (MG) e São Luiz (MA). Com efeito, na região de São Paulo, cerca de 58% das amostras analisadas estavam contaminadas, seguindo-se Vitória e Florianópolis (ambas na costa brasileira). Já em Rio Branco, Araxá e São Luiz nenhuma amostra apresentou contaminação".

A pesquisa mostrou também que o colostro e o leite de transição liberados nas primeiras semanas de amamentação - que possuem mais proteínas e menos gorduras - apresentaram menor contaminação que o leite maduro - que contém cerca de 4% de gordura - o que corrobora estudos já realizados em outros países.

Outra constatação é a de que as mães que amamentam pela primeira vez apresentavam o leite mais contaminado do que as mães que amamentavam outras vezes, o que comprova o efeito cumulativo do PCB no organismo da mãe ao longo da sua vida. Verificou-se, ainda, que quanto maior o tempo entre a primeira e segunda gestações, maior é o re-acúmulo de PCB no leite materno.

*Meu comentário: A poluição é sempre mais intensa quanto menor a altitude, por ser a poluição constituída de partículas normalmente mais pesadas do que as partículas do ar limpo. O mar da Terra com menor altitude é chamado de Mar Morto, por estar extremamente poluído e não sustentar vida em suas águas. Em contraposição, todos os lugares com a maior densidade de pessoas centenárias ficam em locais montanhosos, com alta altitude. Pode ter certeza que essas coisas não são meras coincidências....Ah, mais um detalhe: é ao nível dos oceanos que tem-se a maior intensidade da força gravitacional terrestre! Quanto menor a gravidade, menor o desgaste do corpo humano e, consequentemente, maior a longevidade potencial. No alto das montanhas, onde ficam a maioria das pessoas centenárias, a força da gravidade terrestre é menor do que na costa marítima (local de altitude zero, com relação ao nível do mar)...

Referência:
[1] Carmo Gallo Netto, Jornal da Unicamp, pg. 4, Ano XXIII, No. 423, Campinas - SP, 23 a 29 de março de 2009.

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