domingo, fevereiro 15, 2009

 

O Combate ao Mercúrio

É mais que urgente entrar em ação. Há mais de um século conhecemos os danos que o mercúrio provoca no nosso sistema nervoso

Os ministros do Meio Ambiente reunidos nesta semana em Nairóbi, Quênia, poderão tomar uma decisão de grande importância para afastar uma ameaça mundial à saúde das vidas de centenas de milhões de pessoas.

Uma estratégia para enfrentar seriamente o metal pesado mercúrio e seus compostos altamente tóxicos será discutida pelo Conselho Governante do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) em sua reunião de 16 de fevereiro de 2009.

O "quadro de política" em relação ao mercúrio, resultado de sete anos de discussões intensas lideradas pelo Pnuma, representa o primeiro esforço global coordenado para enfrentar o problema da poluição por mercúrio. Ele abrange a redução na demanda de produtos e processos, do comércio internacional, das emissões de mercúrio na atmosfera e, ainda, a limpeza de locais contaminados.

Os ministros precisam decidir como tais ações devem ser realizadas. Alguns, como os dos países-membros da União Europeia, defendem um tratado cuja observação seja legalmente obrigatória. Outros querem acelerar uma abordagem voluntária.

É mais que urgente entrar em ação. Os danos provocados pelo mercúrio ao sistema nervoso humano são conhecidos há mais de um século. O chapeleiro louco de "Alice no País das Maravilhas" ecoava o fato de que os chapeleiros trabalhavam com mercúrio para reforçar as abas dos chapéus.

Enquanto isso, diretrizes alimentares relacionadas a peixes como atum são, em muitos países, direcionadas só a pessoas em grupos de risco, como gestantes. Na Suécia, por exemplo, cerca de 50 mil lagos têm lúcios (um tipo de peixe) com níveis de mercúrio superiores aos limites aceitáveis segundo as normas de saúde internacionais. As mulheres suecas em idade fértil são aconselhadas a não consumir lúcios, percas e enguias, mas o restante da população só é aconselhada a não consumi-los mais de uma vez por semana.

Impactos potenciais do mercúrio incluem prejuízos às funções da tireoide e do fígado, irritabilidade, tremores, perturbações da vista, perda de memória e, possivelmente, problemas cardiovasculares.

A boa notícia é que, nos últimos meses, tanto a Europa quanto os EUA aprovaram a proibição das exportações de mercúrio; a União Europeia fixou o prazo máximo de 2011.

Enquanto isso, alguns governos, em cooperação com o Pnuma, vêm identificando uma ampla gama de produtos e processos para os quais existem alternativas comprovadas e de baixo custo, que não envolvem o mercúrio.

Para outros, pelo menos em algumas economias e para alguns fabricantes, as alternativas não são tão claras. Vêm à mente as lâmpadas de descarga de alta intensidade para uso fora da indústria automobilística (como as lâmpadas fluorescentes compactas, que usamos cada vez mais em nossos lares, por ser mais eficientes no consumo de energia), algumas telas de cristal líquido (para computadores e televisões) e certos tipos de produção de plástico.

É necessário demonstrar flexibilidade. Mas é preciso determinar uma visão clara e inequívoca de um futuro com baixa utilização de mercúrio. Isso promoverá a inovação e um leque maior de alternativas de baixo custo.

Um caso especial em pauta talvez seja o garimpo de ouro artesanal e em pequena escala. Suas vítimas estão entre as pessoas mais pobres do mundo. Estimados 10 milhões de garimpeiros e suas famílias podem estar sofrendo de contaminação ou exposição prejudicial ao mercúrio em países que vão do Brasil e da Venezuela à Índia, Indonésia, Papua-Nova Guiné e Zimbábue.

Os argumentos econômicos maiores são fortes. Estimamos que cada quilo de mercúrio retirado do ambiente possa gerar até US$ 12.500 de benefícios sociais, ambientais e para a saúde humana.

Enquanto isso, há evidências de que, em lugar de diminuir, a poluição por mercúrio pode estar aumentando, em parte em decorrência do aumento da queima de carvão mineral na Ásia. Das cerca de 6.000 toneladas de mercúrio que entram no meio ambiente no mundo todos os anos, mais ou menos 2.000 toneladas vêm de usinas termelétricas e da queima de carvão em residências. Liberada na atmosfera ou nos rios, a toxina pode percorrer centenas ou milhares de quilômetros (a partir do ponto de poluição).

À medida que as mudanças climáticas provocam o derretimento do Ártico, o mercúrio preso no gelo e nos sedimentos está sendo novamente liberado nos oceanos e na cadeia alimentar. Assim, existem ligações evidentes e positivas entre as decisões tomadas pelos ministros do Meio Ambiente no Conselho Governante e as que serão tomadas ainda neste ano na reunião crucial da convenção climática da ONU que terá lugar em Copenhague (Dinamarca).

Ninguém que vive hoje no planeta está livre de algum nível de contaminação por mercúrio. A Organização Mundial da Saúde afirma que não existe um nível seguro de mercúrio. Portanto, a inação em relação ao desafio global do mercúrio já deixou de ser opção possível.

Devemos isso às grávidas e às crianças ainda não nascidas em todo o mundo, aos garimpeiros e suas famílias. Devemos isso a todos os que desejam um mundo mais saudável e menos poluído.

Fonte:
Achim Steiner [Subsecretário-geral das Nações Unidas e diretor-executivo do Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente)], O Combate ao mercúrio, Jornal Folha de S. Paulo, Seção Tendências/Debates, pg. A3, 15 de fevereiro de 2009.

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